Se nos últimos anos as fintechs foram as favoritas para aportes financeiros e abertura de capital, a pandemia colocou holofotes sobre as startups de saúde, que vem ganhando espaço no ecossistema brasileiro de inovação.
Apenas para ilustrar esse interesse, na semana passada a Beep Saúde, do Rio de Janeiro, levantou um investimento de R$ 110 milhões, que foi liderado pelo fundo norte-americano Valor Capital Group, e dessa forma a empresa está sendo avaliada em R$ 670 milhões, e assim fica entre as dez de maior valor no setor de saúde que tem a liderança do Dr. Consulta, com investimento de R$ 300 milhões em 2017.
A Beep Saúde é uma espécie de “Uber de vacinas e exames”. A healthtech ganhou mercado com aplicação de vacinas em domicílio e, em setembro do ano passado, passou a realizar também coleta de exames laboratoriais, os serviços são oferecidos atualmente em mais de 100 cidades nos Estados de Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e também no Distrito Federal, ou seja a tecnologia ofertando comodidade aos usuários dos serviços de saúde, tendo a Amazon como sua inspiração.
No caso da Beep, a tecnologia por trás da operação funciona roteirizando os pedidos. De acordo com o recebimento dos pedidos o sistema vai ajustando trajetos e estoque.
A saúde está no foco de startups, mas já ocupa também a preferência em gigantes de tecnologia como a Apple.
No livro de oferta (IPO) da Rockley Photonics, uma startup britânica que trabalha no desenvolvimento de sensores de parâmetros de saúde, e que tem a Apple como seu principal cliente, está por traz dos novos sensores de glicose no sangue e álcool, bem como a pressão arterial, itens que estarão incorporados no novos Apple Watch.
Esses sensores, juntamente com o monitoramento da frequência cardíaca já existente, o eletrocardiograma, os algoritmos para determinar certas arritmias e o cálculo da concentração de oxigênio no sangue, vai permitir, transformar o Apple Watch em um verdadeiro “médico em seu pulso”, o que permitiria um monitoramento muito completo dos parâmetros críticos da saúde de muitos pacientes. Tal desenvolvimento poderia levar o Apple Watch a se tornar uma proposta de valor insubstituível para milhões de pessoas com problemas cardíacos, diabetes, doenças respiratórias ou, em geral, praticamente qualquer pessoa interessada no monitoramento preventivo de sua saúde.
Tente imaginar um monitoramento permanente nos níveis de glicose, que comunicam aos pais e responsáveis variações extremas, quantas vidas podem ser salvas por ele?
Muito tem sido dito sobre o potencial desse tipo de wearables no monitoramento de condições crônicas, e incorporar novos parâmetros de relevância especial, como a pressão arterial, não faz nada além de complementar muitas de suas possibilidades nesse sentido, da mesma forma que a incorporação da medida de saturação de oxigênio no sangue há cerca de um ano foi vista por alguns como uma forma de monitorar uma possível contaminação por covid, é só ver o que explodiu a venda de oxímetros.
É mais do que provável que com o aumento da telemedicina, acelerada pela pandemia, que avancemos para serviços baseados no monitoramento preventivo da saúde a partir desse tipo de wearables capazes de monitorar parâmetros que, via de regra, só foram obtidos de forma muito ocasional ou toda vez que você visitava um médico, mas que agora podem ser gerados rotineiramente e praticamente continuamente. Os estudos clínicos realizados com os parâmetros obtidos refletem um enorme potencial para esse tipo de serviço, uma vez que a precisão do dispositivo é complementada pelo aumento do número de medições, o que permite reduzir o erro padrão e considerá-los adequados para a detecção de anomalias. A partir daí, algoritmos de aprendizagem de máquina seriam usados para monitoramento de rotina, e a supervisão de um médico seria alcançada apenas nos casos em que o algoritmo oferece uma interpretação não determinativa, o que implicaria um uso adequado de recursos e um nível potencialmente muito mais adequado de cuidado e com muito mais capacidade de detecção precoce de problemas e prevenção.
Tal sistema seria provável, por um lado, reduzir a morbidade, a mortalidade e, em geral, o sofrimento dos pacientes, ao mesmo tempo em que poderia resultar em uma redução dos custos para o sistema de saúde como um todo, por ser capaz de diagnosticar mais problemas em momentos iniciais quando os tratamentos podem ser aplicados de forma mais eficiente. Existem muitas empresas que estão atuando nessa área de saúde em nuvem que inclui telemedicina, monitoramento, aplicação de machine learning ao diagnóstico e prestação de serviços de saúde, e investimentos significativos estão sendo alocados para um tema que, dependendo do estado atual da tecnologia, não pode ter mais lógica.
Os smartphones chegaram em 2007, e rapidamente se tornou uma das interfaces mais comuns para se relacionar com todos os tipos de informação, e servirem como acessórios aos sistemas de saúde e seguro vem sendo um caminho natural para esses aparelhos cada dia mais dotados de novas funcionalidades.
As funcionalidades desses smartphones e gadgets são cada dia maiores, principalmente pelo fato de que a pandemia ter também criado novos problemas de saúde, entre eles, como resultado das inúmeras reuniões surgiu “fadiga de Zoom”, nome dado ao cansaço excessivo provocado por chamadas de vídeo.
O Google, que também tem sua ferramenta de reuniões, o Google Meet, resolveu também enfrentar esse problema, que internet e sua equipe chama de fadiga de reunião (do inglês, meeting fatigue).
Nos estudos do Google detectou-se que o problema é real, e não mera especulação, pois ele normalmente está associado a situações de trabalho ou de escola. Na pesquisa feita pela plataforma, que as pessoas relataram cansaço ao ficarem expostos à própria imagem. É uma conclusão parecida com a de uma pesquisa da Universidade Stanford publicada no fim de fevereiro, que entre os quatro motivos listados pelo estudo acadêmico estava a alta exposição à própria imagem.
Dessa maneira, segundo reportagem do Estadão, com as pesquisas debaixo do braço, o Google decidiu renovar o design do Google Meet. Agora, o usuário poderá redimensionar a janelinha onde aparece seu próprio rosto. Será possível esconder a própria imagem sem deixar de mostrá-la para os envolvidos na conversa. Outras opções serão reposicionar ou diminuir o tamanho da janela, permitindo o foco em outros conteúdos ou contatos. As mudanças foram implementadas na semana passada.
De fato, as mudanças no design mirando o comportamento de usuários parecem detalhes, mas se tornaram fundamentais para o Google Meet. A plataforma, que antes era apenas uma ferramenta do pacote corporativo, assim como planilhas e calendário, mudou de status na pandemia. Com o home office e a educação a distância, ela se tornou um dos principais produtos do Google, afinal a maioria dessas ferramentas de reuniões era projetada para um número bem menor de reuniões.
Outro dos problemas de saúde, evidenciados durante a pandemia e que aplicativos vem se dedicando é o da insônia. São os apps e playlists que abordam meditação, histórias, guias de relaxamento e até sons de chuva, para aqueles que não resistem a uma noite de barulhinho na janela, que sirva para acalmar e relaxar.
Esses métodos, espalhados por diversas plataformas, ganharam o público: segundo dados do Spotify, obtidos por uma reportagem do Estadão, cerca de 30 milhões de playlists já foram criadas com o tema sono em todo o mundo. No último ano, o aumento na criação e na procura desse recurso foi de 21%. Não é nada tão surpreendente, dado o momento que estamos vivendo. No Brasil, o app de meditação Zen, criado por Christian Wolthers, encontrou a fórmula para atrair usuários como Emanueli. A plataforma, que também está presente fora do País, soma mais de 4,2 milhões de downloads, cerca de 30% deles são usuários em busca de um sono melhor. No conteúdo, 35% das meditações são usadas para driblar a insônia.
A SleepUp também segue a proposta de tentar ajudar a melhorar a rotina do sono oferecendo uma plataforma focada em sono, que tem desde meditações a serviços de telemedicina, com especialistas na área.
Junto com essas soluções, de gadgets, aplicativos e telemedicina nascem também diversas preocupações de ordem legal.
Os dados coletados por esses gadgets são identificados pela Lei Geral de Proteção de Dados, “dados sensíveis”, afinal eles possuem, desde o tipo sanguíneo até a frequência de batimento e pressão, e por isso devem ser protegidos.
Ë fundamental que esses aplicativos, que tratam de dados sensíveis estejam preparados para proteger os seus usuários.
Ao mesmo tempo esses dados não podem ser repassados para terceiros como laboratórios, ou planos de saúde sem a autorização do dono do dado.
Porém muitas questões polêmicas também surgem daí como por exemplo:
Os planos de saúde podem exigir a utilização obrigatória de gadgets como relógios para seus beneficiários?
Beneficiários que resolvam optar por não usar esses aparelhos que monitoram seus dados e as variações dos mesmos, podem ter seu plano de saúde negado?
As administradoras de planos de saúde podem cobrar um preço diferente para os conveniados que se negarem a serem monitorados por esses gadgets?
São todas questões que o Direito precisa enfrentar diante dos avanços tecnológicos.