STARTUPS E MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Em que pese os negacionistas de plantão, aqueles que acreditam que tudo faz parte de alguma ou de muita teorias da conspiração, e que tem realmente muita dúvida de que a terra de fato é redonda, a pandemia parece ter dado início a um reset nas nossas práticas.

Através de uma parada forçada parece ser suficiente para que pudéssemos rever nossas práticas ambientais, hoje com os números já conhecidos após essa parada, temos a certeza, que a sobrevivência no universo corporativo tem prioridade sobre o futuro, e nunca a expressão “cuidar do urgente relegando o importante” ganhou tintas tão claras. Afinal, apenas 6% do dinheiro gasto por países ricos na pandemia foi direcionado a energias limpas, o que bem exemplifica a frase anterior.

O que não quer dizer que startups que tenham como foco as mudanças climáticas não possam estar vendo no momento uma oportunidade considerável.

No primeiro momento, em que os países começaram a injetar bilhões de dólares em suas economias na tentativa de reduzir o impacto da pandemia, em 2020, surgiu a discussão, principalmente na União Europeia, de aproveitar os recursos para impulsionar a transformação para uma economia verde. Passados dois anos, um grupo de pesquisadores da Universidade Johns Hopkins analisou os investimentos feitos pelos países do G-20 (que reúne as maiores economias do mundo), e concluiu que apenas 6% de um total de US$ 14 trilhões foi destinado a políticas que reduzem a emissão de gases de efeito estufa. O porcentual ficou abaixo dos 16% registrados após a crise de 2008/2009, o que pode dar uma dimensão os setores atingidos pela pandemia, ou seja, bem mais ampla.

Logo se durante a pandemia, os Governos ajudaram as empresas com a emissão de dívidas, o que podem eles cobrar agora como contrapartida?

Muitos estão aproveitando para investir em startups que através da tecnologia podem fazer diferença na busca cada dia mais difícil de uma vida sustentável.

Recentemente foi noticiado, que a Village Capital, com o apoio da MetLife Foundation, abriu inscrições, que vão até 5 de agosto para seu programa de aceleração Adapt: Inovação Social para um Futuro mais Resiliente na América Latina.

O programa tem como objetivo apoiar empreendedores de startups no Brasil, Chile, Colômbia e México a continuarem desenvolvendo projetos que contribuam para o cenário de mudanças climáticas, promoção da saúde e mobilidade econômica e que impactam positivamente o destino da região.

O programa de aceleração vai apoiar de oito a dez startups na América Latina que estão criando e ampliando o acesso a soluções nos seguintes temas:

  1. Preparação para desastres: projetos relacionados ao setor de seguros (insuretech) e à recuperação dos desastres naturais
  2. Saúde e bem-estar: projetos de saúde mental, condicionamento físico e acesso à saúde
  3. Saúde financeira: projetos relacionados com fundos de emergência, gestão das necessidades financeiras do dia a dia e preparação financeira
  4. Oportunidades econômicas, de trabalho e de aprendizagem: projetos que podem incluir novas rotas para empregos locais com foco em tecnologia, como meio de impulsionar o desenvolvimento de empregos futuros.

O grupo acredita que promover um programa como este que, não só oferece recursos, mas ajuda no direcionamento dos negócios e abraça novos projetos locais.”

Devido ao seu tamanho e biodiversidade, a América Latina é uma região propensa a enfrentar desastres naturais e outros desafios gerados pelas mudanças climáticas. Além disso, vários países ali localizados enfrentam adversidades, como condições de desigualdade em saúde, alimentação e problemas energéticos e de mobilidade econômica. O acesso limitado dos habitantes às soluções de proteção financeira necessárias, como linhas de crédito, alternativas de investimentos ou produtos de seguros, também acabam impactando neste cenário.

De outubro a dezembro de 2022, as startups selecionadas participarão de quatro workshops online e receberão orientação de potenciais parceiros estratégicos, investidores, clientes e outros fundadores da América Latina e dos Estados Unidos, além de realizarem sessões individuais com um analista de investimento para feedback e apoio.

As duas empresas mais bem classificadas por seus pares receberão uma doação da MetLife Foundation de US$ 20 mil para serem investidos em suas operações locais. Todas as startups que se inscreverem no programa serão convidadas a participar da Abaca, a plataforma online gratuita da Village Capital que ajuda os empresários a projetar marcos importantes em sua jornada para o avanço no seu setor de atuação. A rede fornece ferramentas de diagnóstico e conecta os empresários com investidores e recursos relevantes.

Muitas das novas tecnologias tem servido de moeda nessa transformação, como na já comentada tokenização do carbono.

E como as novas tecnologias como o blockchain podem colaborar nessa mudança?

Um número crescente de startups está explorando, seguindo ideias como as apresentadas por Kim Stanley Robinson em seu livro altamente recomendado “O Ministério do Futuro”, a ideia de transformar mecanismos de compensação de carbono em uma ferramenta ligada ao lucro econômico através de um mecanismo como a emissão de criptomoedas. Robinson, pensa nessa obra uma sociedade futura em transformação.

Existem diversas empresas com planos em diversas abordagens e múltiplos estágios de desenvolvimento explorando o tema, com a ideia de gerar uma economia de carbono que possa funcionar como um incentivo monetário para evitar sua emissão ou se retirar da atmosfera que já foi emitida.

Os mecanismos de compensação de carbono impostos em várias jurisdições são uma forma de fornecer emissões de dióxido de carbono com uma estrutura de mercado que incentiva sua eliminação, e há múltiplos argumentos a favor de seu uso: basicamente, que eles são uma externalidade negativa que minimiza o custo para a sociedade de redução de emissões, e que, além disso, são transparentes, facilmente aplicáveis, geram renda explícita para quem faz isso bem, são ajustáveis e reduzem a incerteza para os atores envolvidos. Em 2019, mais de 3.600 economistas assinaram uma carta em apoio ao uso desses mecanismos como a alavanca mais econômica para reduzir as emissões de carbono na escala e velocidade necessárias. Um documento de partida que em muitos países já encontra base legal na estruturação e emissão desses recebíveis como na distribuição dos mesmos. Algo que do ponto de vista do Direito alimenta uma cadeia de uma ponta a outra, que nasce na auditoria dos projetos, no acompanhamento dos mesmo para lastro e compliance na emissão desses recebíveis.

Logo surgiu assim a ideia de tokenizar emissões e usar uma criptomoeda como forma de incentivar sua compensação surge como consequência natural, pois qualquer ação que remova o carbono da atmosfera, como manter uma floresta em vez de cortá-la, que bem pode ser considerada uma prova de trabalho, e obter como contrapartida uma certa avaliação em uma criptomoeda que pode ser, daquele momento em diante, usado como dinheiro líquido.

A ideia, obviamente, não está isenta de possíveis críticas, como a possibilidade de capitalizar ou “lavar” créditos ambientais de baixa qualidade originalmente emitidos antes de 2010, quando tinham muito pouca supervisão, as dificuldades envolvidas na auditoria e certificação desse tipo de ações, ou o fato de que, em muitos casos, essas empresas oferecem compensação por “coisas que não são feitas”, como cortar um uma área de floresta ou parar de extrair combustíveis fósseis. A realidade é que a necessidade de melhores mecanismos de auditoria para esse tipo de processo já foi exposta em inúmeras ocasiões, e o interesse no assunto continua a crescer.

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