Qual o valor do seu tempo? Qual a importância do tempo nas nossas vidas? No último 17 de maio foi instituído pelo presidente Jair Bolsonaro o decreto 11.072, que permite que servidores públicos trabalhem de casa, até mesmo do exterior, desde que cumpram metas. A norma diz que, a partir de 1.º de julho deste ano, os órgãos poderão adotar programa de gestão que medirá o desempenho dos servidores a partir da “entrega por resultados” e da “qualidade dos serviços prestados à sociedade”, e não mais a partir do ponto de frequência. Denominado de Programa de Gestão e Desempenho PGD, por ser um decreto do fica restrito apenas a administração pública federal direta, autárquica e funcional. A ideia, é que o PGD, seja um instrumento de gestão que discipline o desenvolvimento e a mensuração das atividades realizadas pelos seus participantes;
O decreto se aplica conforme prevê o seu texto aos servidores: 1) Ocupantes de cargo efetivo; 2) Ocupantes de cargo em comissão; 3) Empregados públicos em exercício na administração pública federal direta, autárquica e fundacional; 4) Contratados por tempo determinado, nos termos do disposto da Lei nº 8.745 de 1993; 5) Estagiários.
Caberá aos Ministros de Estado, os dirigentes máximos dos órgãos diretamente subordinados ao Presidente da República e as autoridades máximas das entidades autorizar a instituição do PGD para o exercício de atividades que serão avaliadas em função da efetividade e da qualidade das entregas.
Logo cabe aos mesmos a substituição dos controles de assiduidade e de pontualidade dos participantes do PGD por controle de entregas e resultados, independentemente da modalidade adotada.
Uma vez que a instituição do PGD é ato discricionário da autoridade máxima do órgão ou da entidade e observará os critérios de oportunidade e conveniência, o mesmo ocorrerá caso o órgão ou a entidade entendam pela conveniência de suspender ou revogar o PGD por razões técnicas ou de conveniência e oportunidade, devidamente fundamentadas, como requisito de todo ato administrativo.
Lembro que essas competências podem ser delegadas, e o serão, aos dois níveis hierárquicos imediatamente inferiores com competência sobre a área de gestão de pessoas, vedada a subdelegação.
O modelo poderá ser adotado nas modalidades de trabalho presencial ou teletrabalho, e o decreto não abrange os servidores militares.
O decreto traz regulamentação específica para o teletrabalho no serviço federal. A norma estabelece que a atividade remota dependerá de acordo mútuo entre o agente público e a administração; poderá ocorrer em regime de execução integral ou parcial; terá a estrutura necessária, física e tecnológica, custeada pelo agente público; e exigirá que o agente público permaneça disponível para contato, no período definido pela chefia imediata e observado o horário de funcionamento do órgão ou da entidade, por todos os meios de comunicação. A opção pelo teletrabalho não poderá implicar aumento de despesa para a administração pública federal, diz o texto.
É muito provável que diversos Estados repliquem com pequenos ajustes a norma, principalmente em ano eleitoral, e em muitos caso com pouco rigor nas metas e requisitos.
É evidente que o teletrabalho é irrefreável, mas ele precisa seguir critérios técnicos de produtividade, qualidade e eficiência bastante rígidos e não ser visto como mais um privilégio para o serviço público, pois isso não seria justo em um país onde o desemprego atinge a uma população maior do que do Uruguay e Paraguai juntos.
O teletrabalho, seja no serviço público ou na iniciativa privada segue os mesmos princípios, mas lembro que no caso do serviço público é toda a sociedade que paga por ele, e logo o dever funcional se amplia.
Para muitos existe o mito de que se ver fisicamente é algum tipo de vantagem para o trabalho e, supostamente, o desenvolvimento da inovação corporativa.
Enquanto muitas empresas persistem em sua cultura de controle chegando em muitos casos a instalar o chamado Bossware, em seus computadores que trabalham de forma distribuída para estender esse controle para quando não estão à vista, algumas outras, infelizmente uma minoria, estão percebendo que forçar seus funcionários a retornar ao escritório é um erro.
A inovação não ocorre das 8hs as 18hs, e acreditar que alguns trabalhadores forçados a ficar em um determinado lugar esse cronograma será mais inovador do que outros que trabalham de onde querem e em uma cultura de confiança é, simplesmente, estupidez.
Inovar não tem nada a ver com gastar dinheiro em futebol de mesa, torneiras de cerveja ou cadeiras de massagem. É o produto de uma cultura. E se você quer obter essa cultura, a filosofia de controle simplesmente não funciona. Submetido a uma cultura baseada no controle, o trabalhador não inova: só faz seu trabalho, sem mais.
O problema é, como eu disse, na falta de ambição. Muitos gestores continuam a ver videoconferência e ferramentas de trabalho assíncronas, como documentos compartilhados, sistemas de mensagens e outros como um “problema de pandemia”, e isso é uma limitação muito forte. Eles simplesmente não foram capazes de aprender a usar essas ferramentas pelo tempo que tentaram, e eles apenas tentaram fazer a mesma coisa que fizeram sem elas
Primeiro de tudo, você tem que fazer seus trabalhadores usarem bem essas ferramentas. Uma videoconferência não está aparecendo em uma tela de aparência patibular, com uma parede atrás dela e com as bordas pateticamente fora de foco enquanto uma auréola é gerada ao seu redor toda vez que você se move. Isto é, neste momento, simplesmente imperdoável, refletindo um nível alucinante de negligência e desinteresse. Assim que você fez reuniões distribuídas, você deve ter aprendido a iluminar em condições, como lidar com uma câmera virtual, como colocar uma câmera decente, segundo monitor e microfone, e como usar uma tela verde no mínimo.
Há pessoas de empresas inovadoras que simplesmente não conhecem fisicamente seus pares ou seu chefe. E está tudo bem. Nada. Eles trabalham perfeitamente de onde querem, são mais felizes, têm reuniões perfeitamente produtivas e inovam. Eu mesmo trabalho com várias pessoas que eu nunca vi pessoalmente, e ainda assim eu tenho uma relação profissional perfeitamente completa com eles, eu sinto que eu as conheço, falamos em muitas ocasiões sobre temas que não são estritamente trabalho, contamos piadas um ao outro, rimos, relaxamos e nos sentimos confortáveis em trabalhar. Pensar que isso é impossível é simplesmente falta de ambição. Mitologizar o contato físico só reflete uma coisa: que alguns pobres chefes sentem que quando os trabalhadores não estão no mesmo lugar físico que eles, eles não podem controlá-los.
Você quer inovar? Ensina as pessoas a trabalhar confortavelmente de onde quiserem. Abandone a cultura do controle e substitua-a por uma baseada na confiança. A inovação exige isso, confiança, diversidade de experiências e visões, e é enriquecida pelas ferramentas e atitudes certas
Nesses momentos muitas são as reflexões que nos surgem nessa relação, postos de trabalho e tecnologia, e jornada de trabalho e empregos.
Vejamos então, se o desenvolvimento tecnológico permite um esforço menor, então qual a razão de nos sentirmos ainda mais cansados?
Afinal se o desenvolvimento da tecnologia permite níveis cada vez mais elevados de produtividade, qual a razão de levarmos tanto trabalho para as nossas casas e atravessarmos noites e fins de semana trabalhando?
Segundo um estudo da Comissão Europeia, atualmente 37% dos empregos no continente europeu poderiam ser realizados remotamente. Logo, pense no seguinte: mais pessoas trabalhando em casa significa uma mudança no trânsito, com ganhos de produtividade na locomoção para todos, bem como alteração de parte do eixo econômico para os bairros, o que significa uma melhor distribuição do fluxo da renda. O que representa mais atividade no bairro com tempo para academias, cursos de línguas e pais que podem levar e buscar seus filhos no colégio a pé.
Incrível como as coisas mudam ao nosso redor, e para o nosso negócio continuamos respondendo de forma conservadora, querendo ver todos ao nosso redor e dispor a todo tempo.
Nesse instante não faltam recursos tecnológico para o trabalho a distância para parte significativa da mão de obra. É obvio que isso não é para todas as funções.
Fica cada vez mais claro que o trabalho do futuro não terá nada a ver com engarrafamentos ou trabalhadores sentados em uma cadeira por quase 8 horas para mostrar que estão fazendo algo. Quando o empresário bloqueia essa mudança pode estar colocando a sua empresa em desvantagem, em comparação com aqueles que são capazes de entendê-lo antes.
As inovações tecnológicas são vantajosas por um período de tempo, cada vez mais curto. Quando você substituiu sua máquina de escrever por um computador seu ganho foi imediato diante de todos os seus colegas, mas esse ganho durou alguns meses até que eles também comprassem seus computadores.
Porém hoje a velocidade com que as inovações tecnológicas são produzidas em escala são ainda maiores, veja por exemplo no número de atualizações que seus aplicativos recebem diariamente no seu celular.
Os ganhos tecnológicos permanecem hoje por um período bem menor, pois a cultura do mercado compele novos agentes para ofertarem os mesmos ou melhores benefícios em escala para todos.
Veja no exemplo dos automóveis, por maios inovações que um modelo de luxo possua a escala para barateamento da solução tecnológico em um período muito curto entrega os mesmos benefícios para um automóvel bem mais barato, se dúvida vá até uma concessionária e veja como avanços tecnológicos já estão incorporados em veículos de entrada.
A reorganização do trabalho e do nosso nem sempre necessário deslocamento é antes de mais nada um ato de ressignificar o tempo, e que ele seja melhor utilizado, como me disse uma sábia amiga “tempo é a coisa mais preciosa que a gente pode dar pra alguém. É tão difícil quanto preciso.” Que sejamos felizes nas mudanças que revolucionam vidas.
(Artigo publicado no site www.jusbrasil.com.br, em 21 de Maio de 2022).