OS CHIPS SÃO O NOVO PETRÓLEO?

No último ano estamos assistindo o efeito mundial da falta de chips para toda indústria, e antes que um delirante crie uma nova teoria da conspiração colocando os chineses como culpado, alerto que a falta atinge toda indústria eletroeletrônica do mundo, e isso inclui a China.

Grandes empresas como a HP e a Dell, já alertaram na apresentação de seus últimos resultados trimestrais que os problemas de fornecimento de componentes, com a crise dos semicondutores ainda não resolvidos, estão impedindo o crescimento da indústria de PCs.

Lembro que essas empresas se beneficiaram da elevada demanda por computadores pessoais decorrentes das necessidades de teletransporte e educação a distância durante a pandemia. Segundo dados da consultoria IDC, o mercado global de PCs cresceu 13% em relação ao segundo trimestre. Por sua vez a Dell também confirmou em sua conferência com analistas que as questões de fornecimento de componentes continuarão, em que pese ter apresentado uma receita recorde de 26,12 bilhões de dólares apenas no trimestre encerrado em julho, um aumento de 15%.

Nesse momento a maior fabricante de chips do mundo, a TSMC que é de Taiwan, e que já havia tornado público em julho último suas expectativas de que a crise dos chips começaria a diminuir neste próximo trimestre, já anunciou um aumento de 10% em seus preços dos chips mais avançados e de 20% para os chips de gerações anteriores, ou seja os mais comuns para toda indústria.

Para se ter a dimensão da concentração de produção desses chips, apenas a TSMC fabrica 92% dos chips mais sofisticados, e 60% de outros mais simples), com uma com uma vantagem tecnológica significativa sobre as demais, e cujo preço afeta um número bem maior de produtos, ou seja vem alta mundial de preços para tudo que dependa de chips e seus circuitos integrados.

Toda a indústria automobilística do mundo sentiu, com exceção da Tesla, uma empresa mais tecnológica do que automotiva que foi capaz de redesenhar seu software para manter sua produção, logo não parou por nenhum dia todas as suas plantas de fabricação, ao contrário de todas as demais empresas de automóveis, que foram forçadas a fechar suas montadoras, reduzindo inclusive seus investimentos em publicidade em todo o mundo, impactando toda mídia do mundo, visto que estão entre os maiores anunciantes.

A evolução da tecnologia e da fabricação de chips está afetando até mesmo a geopolítica, pois nesse instante os Estados Unidos já anunciam investimentos de até US$ 52 bi. Para construir sete fábricas para produção de chips em solo americano, ainda que com tecnologia atrasada se comparada a líder de Taiwan.

Estamos falando de uma indústria extremamente complexa, na qual um pequeno nanômetro define uma imensa vantagem tecnológica, e em que as matérias-primas são encontradas apenas em poucos lugares, onde as empresas que projetam a arquitetura dos chips são diferentes daquelas que projetam e fabricam as maquinas pra lá de especializadas para fabricá-las.

Chegamos a um momento curioso, voc6e pode substituir seu carro movido a petróleo por outro movido a energia elétrica, mas em ambos sua dependência será cada vez maior dos chips, logo o que é mais importante?

A concentração vista nas plataformas digitais, as Big Techs, é ainda maior na produção de chips, e ninguém havia se debruçado sobre isso, pois a mesma pandemia que impulsionou os negócios de gigantes da tecnologia, também impulsionou a demanda pelos microprocessadores.

A guerra comercial entre EUA e China, vai desde a limitação da ação das plataformas como o TikTok, e vai para os semicondutores, atravessando o Estreito de Formosa e atingindo a maior fabricante de semicondutores do mundo.

Conhecida como TSMC, a Taiwan Semiconductor Manufacturig Company, que é atualmente responsável pela fundição de chips para as principais cadeias de suprimentos globais, tornou-se o mais recente cavalo de batalha na luta política e tecnológica entre essas duas potências, curiosamente justamente a empresa taiwanesa que tem relações pra lá de espinhosas com a China.

Num processo verticalizado, onde todos os grandes players são essencialmente montadoras, como a Apple, Qualcomm, Broadcom, Cisco Systems e Nvidia essas norte americanas, a TSMC viu seus planos de construir em 2020 uma fabrica no Arizona irem por água abaixo ainda no Governo Trump, quando o Departamento de Comércio dos EUA divulgou regras que impactaram diretamente os negócios da companhia taiwanesa.

A primeira delas foi obrigar desde setembro de 2020, que fabricantes que usam equipamentos ou tecnologia de propriedade norte-americana precisarão solicitar uma licença antes de fornecer produtos à gigante chinesa de telefonia Huawei, responsável por cerca de 14% da receita da TSMC, o que já atingiu a empresa de Taiwan.

A TSMC, foi fundada em 1987, foi a primeira empresa do mundo voltada para a fundição de semicondutores. Seu modelo de negócio foi pioneiro por se concentrar na fabricação de chips sob medida. Envolvida em 272 processos de produção tecnológica distintos e atendendo a uma rede de 499 parceiros na Ásia, Europa e América do Norte, em uma visão global com operações em todo mundo.

Por não ter produtos de consumo final como Intel e Samsung a TSMC se diferenciou das demais fabricantes de semicondutores como a Intel e a Samsung, que por hábito acabam reservando os melhores chips a seus próprios produtos. Sendo que muitos dos clientes da TSMC são fabricantes de semicondutores de circuitos integrados, mas não dispõem da capacidade para produzi-los em massa, acredita-se que seus maiores clientes sejam a Apple 23%, e um subsidiária da Huawei, HiSilicon com 14%.

Curiosamente, apesar da nova fábrica do Arizona(em atraso) vá contribuir apenas para algo como 3 a 4% da receita da TMSC, o gesto se manifesta como aproximação do bloco industrial norte americano e não Chinês. De forma resumida é os EUA se aproximando de Taiwan, o que os chineses não gostam nem um pouco.

Para termos ideia de alguns números dessa guerra o governo chinês planeja investir, nos próximos cinco anos, 1,4 trilhão de dólares (10 trilhões de yuans) em infraestrutura e inovação tecnológica de projetos que vão desde a construção de redes sem fio 5G a softwares de inteligência artificial (IA) para a automatização de fábricas e direção automática. Sendo que nessa projeção há o propósito de expandir a indústria doméstica de semicondutores, buscando assim elevar a taxa de autossuficiência no setor para cerca de 40% ainda em 2021, enquanto aqui nosso líder para o país desejando colocar uma impressora nas nossas urnas digitais, que fase a nossa.

Tanto o Governo Trump como o Governo Bidem, sabem da importância de se controlar esse mercado de componentes de tecnologia, de onde se baseia toda cadeia da nova indústria. Por isso o fazem com o mesmo rigor que controlam as transações financeiras. O que só é possível graças ao domínio dos EUA sobre a produção de semicondutores à base de silício.

Do outro lado, enquanto as relações entre os dois países se complicam, a Huawei também procura atender às suas demandas de semicondutores internamente. Assim, uma consequência da ação da TSMC seria o desenvolvimento mais acelerado de semicondutores próprios, diminuindo assim a dependência da empresa de Taiwan, por isso procura a SMIC, empresa chinesa sediada em Xangai que já é a maior companhia chinesa de fundição de chips, que está sendo investida com aporte de US$ 2,25 bilhões de fundos estatais, administrados pelo governo chinês e pela cidade de Xangai, numa briga de gigantes nesse xadrez da tecnologia, onde cada movimento de peça é cuidadosamente estudado.

Mesmo com os investimentos a TSMC continuará sendo a maior fabricante de chips por contrato do mundo, pois nesse momento a China ainda ocupa apenas a quinta colocação nesse estratégico mercado. Ao mesmo tempo enquanto a TSMC fabrica produtos de ponta com a tecnologia de 5 nanômetros, a SMIC pode estar atrasada quase uma década, é bom lembrar que dez anos de atraso em tecnologia é uma eternidade, e enquanto você estiver se movimentando para diminuir o atraso, o seu concorrente com melhor escala e preço também estará trabalhando no desenvolvimento dos seus produtos.

Todos os movimentos indicam que os Estados Unidos temem a influência da China em Taiwan e sua capacidade de invadir ou sabotar as cadeias produtivas que passam pelo país insular. Os semicondutores da TSMC também têm aplicações militares e são utilizados em aeronaves, satélites e drones.

O fato é que no médio prazo, a estratégia da Huawei para seus smartphones de alto nível, que utilizam chips de 7 nanômetros será entregar o negócio a outros atores chineses como Xiaomi, OPPO e VIVO, cobrar taxas de patente e esperar pelo inevitável avanço do chip chinês enquanto continua a produção de equipamentos 5G, para os quais tem chips suficientes, ou seja ampliar a influência na china liberando as fabricação e sendo remunerada pelas patentes já desenvolvidas. O que é de conhecimento da maioria dos especialistas é que o sistema Harmony da Huawei é mais eficiente do que o Android. E ele funciona com chips menos exigentes, principalmente porque com a expansão do 5G, a maior parte do trabalho em smartphones pode ser executada por servidores em nuvem.

A consequência natural, entre outros fatores, dos pedidos de patentes do Leste Asiático a um múltiplo de 3,46 vezes a taxa dos EUA, está sendo vista agora e é o elemento catalizador dessa guerra, os orientais fizeram o seu dever de casa.

A história da humanidade é essencialmente a história dos avanços tecnológicos, e curiosamente os chips, com sua produção concentrada na mão de poucos, e com domínio absoluto na mão de um só fabricante na ilha de 23 milhões de habitantes, de frente pra China e de péssimas relações com os chineses, é mais um curioso ingrediente nessa guerra de patentes, chips e muita tecnologia para o fundo principal que é definir quem vai ganhar a guerra no mundo regrado pela Inteligência Artificial e pela Internet das Coisas.

E inegavelmente nesse novo estágio evolutivo da humanidade os chips parecem ser o novo petróleo.

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