Em uma pesquisa divulgada em de 2020, com pouco mais de seis meses da pandemia, pelo Instituto DataSenado mostrou que a diferença entre a educação na rede pública e na privada também se revela no acesso dos alunos ao ambiente digital. Dos lares brasileiros cujos estudantes estão tendo aulas remotas na rede pública, 26% não possuem internet. Quando a pesquisa olha para os colégios particulares, o total de alunos sem conexão online cai para 4%.
Os números falam por si, pois em julho de 2020, essa migração provocou um aumento de 73% só na rede municipal de educação infantil de São Paulo. Onde o levantamento da OCDE também mostrou que o número de dias de escolas fechadas prejudicou mais os estudantes brasileiros do que os alunos dos demais países. No final de junho as escolas brasileiras estavam há 16 semanas sem aulas presenciais, cerca de 2 semanas a mais do que a média das escolas dos países avaliados. No início de setembro, só oito dos países avaliados ainda permaneciam com as aulas suspensas, entre eles, o Brasil.
Nesse momento 44 milhões de crianças e adolescentes que estão nesse ciclo educacional, cerca de 4,8 milhões, não conseguiram aproveitar as aulas virtuais por falta de acesso à internet, como vimos na pesquisa realizada pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), esses números revelam as dificuldades que os Estados e Municípios, esse é o desafio, sem delírios nem política de palanque.
Como ajudar essas famílias que conseguiram adquirir equipamentos eletrônicos, ainda que com má qualidade, resultando em um acesso de baixa precisão, em prejuízo ao aproveitamento das aulas virtuais dos seus filhos?
Afinal é o capital humano que faz a diferença na transformação digital, mas é preciso o mínimo de infraestrutura tecnológica para que possamos formar esses profissionais, não é apenas um requisito laboral, mas sim uma questão de valor humano. A cidadania digital, se faz com acesso pleno a todos e não apenas poucos favorecidos.
É preciso deixar claro que a pandemia não apenas teve um impacto imediato sobre as desigualdades, seja entre os países mais ricos e os mais pobres, seja, dentro de cada país, entre as classes mais ricas e as mais pobres, como ao mesmo tempo emperrou brutalmente o principal motor de crescimento econômico e mobilidade social: a educação. O ensino remoto, além de provocar um déficit generalizado no aprendizado, aumentou a distância entre os alunos com melhor e pior desempenho e entre os alunos ricos e os pobres.
Um estudo da FGV Social, publicado recentemente pelo jornal Estadão, destacou que, os alunos mais pobres são 633% mais afetados pela falta de oferta de atividades escolares que os mais ricos.
Sendo que a nossa Lei de Diretrizes e Bases da Educação estabelece jornada diária de quatro horas. Mas durante a pandemia a jornada ficou em cerca de 2,3 horas. Dos 30 milhões de estudantes entre 6 e 15 anos, a FGV Social calcula que cerca de 4 milhões (13,5%) não receberam qualquer atividade para ensino remoto. Entre os adolescentes de 16 e 17 anos, foram 17,6%. Esse apagão está massivamente concentrado nas classes baixas e nos Estados mais pobres.
Como destacamos, a falta de oferta se dá pela falta de conectividade, de dispositivos digitais e de envio de material por parte da rede de ensino. Segundo o Ipea, 16% dos alunos do Ensino Fundamental (cerca de 4,35 milhões) e 10% dos alunos do Ensino Médio (780 mil) não têm acesso à internet. Paralelamente a esses dados da rede pública, os números das redes privadas e da classe A, são bem diferentes, pois lá cerca de 100% dos estudantes possuem acesso, já nas classes D e E são apenas 40%, e depois tem deslumbrado que ainda vai falar em meritocracia. “Acorda Alice”.
Essas diferenças são apontadas pela OCDE, e não por um sindicato de “comunistas” ou pelos partidos de oposição como gritam os delirantes toda vez que apresentamos um dado que não seja favorável, e logo dizem que a culpa é da mídia.
Ao mesmo tempo a OCDE sugere tornar a prova digital, inclusive para que os resultados saiam mais rápido, o que seria um desafio e tanto dado as nossas distorções no acesso ao sistema, como evidenciamos acima.
A própria, OCDE recomenda ainda ouvir especialistas, esclarecer processos de liderança e tomada de decisão, além comunicar os principais objetivos do exame. Além disso, sugere repensar o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), à luz do novo Saeb e com um olhar para a equidade.
O que não nos falta são boas referências, como a Austrália e Coreia do Sul, que bem podem inspirar o nosso plano nacional, e nunca foi tão fácil ter acesso ao que dá certo em outros países.
A Austrália venceu essas barreiras em 2016: o país definiu, com apoio de especialistas, exatamente como a avaliação se alinharia com o currículo, e semelhante ao que ocorre no Brasil, as autoridades estaduais e territoriais australianas têm autonomia para decidir como implementar o currículo nacional. Portanto, era importante que avaliações não só medissem a aprendizagem em relação aos objetivos nacionais, mas também ajudassem a monitorar a implementação do currículo em todo o país, sem perder tempo e jogar a nossa culpa para debaixo do tapete reclamando sempre da Federação.
A outra referência utilizada pelo relatório da OCDE é o da Coreia do Sul.
Os sul coreanos, criaram um mecanismo de prestação de contas formal, que faz com que o governo após identificar escolas com mais alunos abaixo do nível básico de desempenho medido pela avaliação nacional, o governo estabelece apoio por três anos a esses colégios, dessa maneira escolas com desempenho mais fraco conseguem avançar.
Os últimos anos vivemos um debate infrutífero, com um processo de desmanche do ministério da educação, e a internet, pode ver nos diversos grupos das inúmeras redes sociais, vídeos que pegavam exemplos isolados para denegrir a imagem do ensino público superior, esquecendo de todos os índices que o ensino superior de qualidade tem, ou toda a nossa fuga de cérebros que vem ocorrendo nos últimos dois anos, são de cientistas do ensino privado.
O fato é que temos sim uma distribuição desigual de oportunidades, onde a meritocracia, vira quase um palavrão, ou um sonho para inocentes úteis.
E na base que se dá a evasão, e ela quem condena milhões de brasileiros a miséria.
A tecnologia precisa ofertar ferramentas para o acesso, parando a sangria da evasão, e diminuindo a distância entre o ensino básico público e o privado.
O Direito a Educação é um Direito previsto em Nossa Constituição, e lá ela fala em ensino de qualidade, ofertado a todos, não realizando distinção entre o básico e o superior.
Afinal se a inclusão digital significa democratizar o acesso às tecnologias da informação, permitindo a inserção de todos na sociedade do conhecimento, ter uma máquina de cartão de crédito na mão de um pedinte é um exemplo dessa inclusão? É claro que não, pois o que temos é apenas um gesto de sobrevivência na dura e cruel lógica do mercado, provando que o que é bom para o mercado nem sempre é bom para construção de uma sociedade mais justa.
Logo, estamos diante do desafio de ampliar o acesso aos meios de acessibilidade digital, e a formas de obter aprendizado e consequentemente, a melhores condições de vida e sustento, possibilitando assim que as pessoas tenham meios de exercer seus direitos e desenvolver a plenitude de seus potenciais humanos de forma evolutiva.
Três são os requisitos mínimos para fazer acontecer a inclusão digital, que podem ser identificados como instrumentos básicos e não únicos:
dispositivo para conexão;
acesso à rede;
e domínio dessas ferramentas.
Ter o equipamento não basta se a usabilidade dos seus recursos é limitada pela falta de conhecimento, ou seja apenas o equipamento não garante inclusão.
Devemos também destacar que a acessibilidade vai muito além do universo das pessoas com alguma deficiência, englobando desde aqueles com uma leve dificuldade em enxergar, até idosos e pessoas com baixo letramento (analfabetos e analfabetos funcionais). Por isso é fundamental que o design dos aparelhos tenha o devido cuidado com as pessoas.
A importância disso pode ser identificada quando em 2011, a Organização das Nações Unidas (ONU) estabeleceu o direito ao acesso à internet como um direito fundamental para garantir a livre manifestação de pensamento durante a Primavera Árabe.
No Brasil possuímos cerca de 420 milhões de aparelhos digitais ativos, incluindo nesse número, smartphones, computadores, notebooks e tablets. O que representa uma média de dois dispositivos digitais por cada brasileiro, porém apenas 60% dessa população tem acesso a rede, o que ainda nos deixa muito distantes de países desenvolvidos.
Em que pese essas limitações, cerca de 85% dos usuários de internet no Brasil navegam na web todos os dias, em uma média diária de 9h 29 min por dia conectados, cerca de 50% acima da média mundial que é de 6h e 42 min.
O que as pesquisas indicam é que temos três grupos com desempenho levemente inferior aos demais: idosos, mulheres jovens e pessoas de baixa renda, o que justifica o que pretendemos com esse artigo.
A inteligência Artificial, se regrada observada a isonomia de oportunidades pode ser uma aliada nesse processo para reduzir o nosso atraso.
Para se ter uma ideia da importância dessa discussão aprofundada, e dos passos firmes na política de Estado para incorporação, regramento e absorção escalonada das mudanças provocadas pelas novas tecnologias (5G, Aprendizado de Máquina, Internet da Coisas e Inteligência Artificial), em setembro de 2018, o McKinsey Global Institute publicou um estudo abrangente sobre o impacto da inteligência artificial na economia e nas organizações.
Entre as principais conclusões, apontou que a inteligência artificial agregará cerca de US$ 13 trilhões (ou cerca de 15%) ao PIB mundial até 2030, trazendo parte do tão aguardado aumento de produtividade mundial, estagnada há anos.
Ao mesmo temo, o estudo mostrou que essa agregação de valor será bastante desigual entre países, entre setores e até entre empresas de um mesmo setor, uma resultante do impacto que a velocidade de adoção da inteligência artificial tem em sua geração de valor. Lembro que a adoção de tecnologia de forma transversal significa aplicar a inteligência artificial em efetivamente todas as unidades de negócios, áreas, departamentos e setores para de fato conseguir extrair os benefícios de sua incrível capacidade de automação e otimização de pequenas tarefas, que, quando concatenadas, fazem a diferença e efetivamente criam vantagem competitiva.
Porém, o mesmo estudo indica que, os followers, as empresas que mergulharem tardiamente na adoção da tecnologia, experimentarão um período de desencaixe levemente mais longo do que os front-runners (primeiros da fila na adoção da I.A.), terão benefícios drasticamente menores, logo tempo e força (direção) são os principais fatores nessa transformação que vivenciamos em nossa história.
Tudo se desenha para uma participação onipresente da China no pleno uso da IA, o que por certo deve desigualar por inteiro o que convencionamos chamar de indústria 4.0. Se décadas atrás eram competitivos pela mão de obra barata, essa característica ficou no passado. E hoje o que vemos é o elevado nível tecnológico da indústria chinesa, que ganha o mercado mundial pela escala e, agora, pela transformação digital do tecido produtivo do país.
Esses estudos e seus números só aumentam a importância do papel estatal no investimento em inteligência artificial e na distribuição coletiva para médias e pequenas empresas desse valor agregado pela inteligência, como instrumento de combate à desigualdade, sem essa ação política, sem o incentivo financeiro e sem a distribuição igualitária desse acesso, não iremos conseguir diminuir essa distância, que condena milhões à maia absoluta miséria.