COMPLIANCE DIGITAL E O PREÇO QUE SE PAGA PELO ÓDIO

Adidas, Volkswagen, Honda, Vans, HP, Pfizer, Unilever, Coca-Cola, Verizon, Ben & Jerry’s, Pepsi entre tantos outros grupos que já passaram de 400, resolveram aderir ao movimento Stop Hate for Profit e informaram que deixarão de anunciar no Facebook, em que pese o recente anúncio de Mark Zuckerberg, disposto a combater o discurso do ódio.

A lista cresce diariamente, seguindo o movimento Stop Hate for Profit, iniciado por grupos de direitos civis dos EUA e que vem trazendo enorme prejuízo a plataforma na medida que seus maiores anunciantes resolveram dar uma pausa em seus gastos com publicidade digital, aguardando que o discurso de Zuckerberg tome forma e gesto de ação e não apenas de palavras ao vento.

O episódio das cores e o tamanho do ativismo digital demonstram a preocupação de anunciantes no compliance de gestão de suas marcas.

Na última semana a Liga Anti-Difamação disse que o Facebook se recusou repetidamente a remover anúncios políticos que continham “mentiras flagrantes’ e demorou a responder a pedidos de retirada. Afinal, notadamente apenas reuniões entre executivos não representa nenhum recado de ajuste de conduta.

Expectativas de resultados alterados motivados pela redução de investimentos de marketing digital, gera imediatamente repercussões no valor dos papéis na bolsa, e foi o que aconteceu de imediato, embora lentamente o papel se recupere. A posição do Facebook para o mercado pode ser bem entendida pela manifestação de sua vice presidente: “Não fazemos alterações nas políticas ligadas à pressão da receita”, Carolyn Everson. No documento enviado a alguns anunciantes a executiva foi além: “Definimos nossas políticas com base em princípios e não em interesses comerciais”, e ai fica a pergunta: Quais princípios? O de permitir o estímulo ao ódio?

Zuckerberg fez a defesa da sua postura alegando que posts de políticos e agentes públicos que violem as políticas da plataforma serão mantidos, mas receberão um selo comunicando de que se trata de conteúdo com relevância jornalística. “Permitiremos que as pessoas compartilhem esse conteúdo para que seja condenado, porque essa é parte importante de como discutimos o que é aceitável na sociedade mas vamos alertar as pessoas de que esse conteúdo pode estar violando nossas políticas”, disse. De acordo com a política do Facebook, conteúdos que incitam a violência ou a supressão de votos não serão tolerados e serão removidos.

O compliance da publicidade se fez presente, alterando o foco do planejamento e do debate, onde as métricas de audiência e tecnologias de direcionamento deram espaço para a necessária reflexão sobre temas como racismo sistêmico evidentemente catalisado nas últimas semanas pela indignação do mundo após o assassinato de George Floyd pela polícia americana, e nesse vendaval, o Facebook foi criticado por sua abordagem tímida no controle de conteúdo.

Os primeiros gestos mais acentuados da plataforma foi proibir o movimento da extrema direita “Boogaloo” e prometer destacar as informações com fontes seguras, além de reforçar sua política de moderação de conteúdo.

Qual o impacto então do protesto dessas marcas? Apenas o dano à imagem, que deve ser relativizado pelo exercício de monopólio das redes sociais no ocidente, afinal do ponto de vista financeiro, a leve flutuação do valor das suas ações, que devem se recuperar rapidamente e a queda pequena das receitas temporariamente desses anunciantes não impactará o balanço do Grupo de Zuckerberg, afinal, para se ter uma ideia do tamanho da sua base de receita, os 100 maiores anunciantes da plataforma representam menos de 6% do total de sua receita, pois o que mantém o seu faturamento é a gigantesca base de anúncios de pequenas e médias empresas que colocam anúncios em sua plataforma, são cerca de oito milhões, e para essas pequenas e médias não existe muita alternativa de anúncio em outras redes sociais que não pertençam ao Grupo (Facebook, WhatsApp e Instagran).

A gestão dos dados do seus usuários, em que pese toda polêmica no tratamento desses dados e do enfrentamento legal com a LGPD, torna o Facebook um caminho obrigatório para os anunciantes.

A questão toda dessa discussão, e’ como ela influi na audiência da rede, onde opiniões e posições extremas alimentam discussões ainda mais extremas, onde cada vez se tem menos simpatia.

Qual é o limite legal para as Redes Sociais fazerem o corte entre o que é posição política e o que representa “discurso do ódio’”? Qual a divisa da fronteira estabelecida entre a liberdade de expressão e o discurso do ódio?

Se não podemos amar nossas diferenças, não precisamos odiá-las e nessa linha, quem distingue o certo e o errado se não o conjunto de valores ideológicos dominante?

Essa é uma discussão impossível de ser ter nas redes sociais chinesas, o que só aumenta a vantagem comercial delas.

É bom lembrar que as redes sociais construíram seus modelos de negócios com base em publicidade direcionada e para isso as informações pessoais obtidas dos usuários são fundamentais, por isso se valoriza na sua linha do tempo tanto as curtidas e comentários.

Logo a pergunta é fácil: O ódio muitas vezes revestido de discussão, gera benefícios a rede? Na balança financeira da rede de dados, audiência sempre irá pesar mais do que opinião, pois não há espaço para nada além dos resultados financeiros entregues aos acionistas, o resto é só discussão, importante, mas discussão.

É evidente que ainda que a campanha contra o Facebook possa produzir algum resultado no curto e médio prazo, sua regulação é apenas uma questão de tempo e forma.

O Direito, através do Marco Civil na Internet e da nova LGPD deve oferecer ferramentas para esse impositivo debate, dando a ele suas linhas limítrofes.

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