BIG TECHS, E O ABUSO DE POSIÇÃO DOMINANTE

Duas ações coletivas colocam o Google e a Apple no banco dos réus em Portugal, por abuso de posição dominante, o que pode se repetir em todo mundo.

Cerca de 6,5 milhões de afetados, este é o número de cidadãos portugueses prejudicados pelo abuso de posição dominante e preços excessivos e injustos por parte do Google e da Apple. Este Isso é estimado pelo conglomerado jurídico de escritórios de advocacia que ajuizou duas ações de classe opt-out, um mecanismo de demanda coletiva.

Assim os escritórios jurídicos em suas demandas judiciais contra a Apple e o Google, reivindicam das gigantes da tecnologia cerca de 198 milhões de euros (R$1,041Bilhões) por, segundo os demandantes, violar sistematicamente a lei de concorrência portuguesa e aplicar um preço excessivo e injusto aos usuários em Portugal para a aquisição de aplicativos e outras compras feitas na Apple App Store e Google Play Store, prática que também se repete no Brasil.

São quatro os escritórios que consolidaram essas demandas de classe opt-out. As duas reivindicações têm a mesma base, abuso da Apple e do Google através de suas lojas. São duas questões para as quais as empresas de tecnologia estão infringindo as leis do mercado. Por um lado, quando você compra seu celular ou tablet com sistemas iOS ou Android, os dispositivos têm suas lojas pré-instaladas para comprar aplicativos. Além disso, cobram uma comissão de 30% sobre todas as compras feitas em suas lojas alusivas ao desenvolvimento delas, que é uma posição de domínio do mercado.

Assim, essas duas ações propõem que todos os consumidores de Portugal que fizeram uma compra desde 1º de janeiro de 2013 através de qualquer uma das lojas das empresas de tecnologia poderão recuperar um valor que os juízes terão que estimar.

O que esses escritórios fizeram foi colocar as duas ações na corte portuguesa especializada no assunto, o Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão de Santarém, em nome de todos os consumidores afetados.

O funcionamento das ações de classe é muito diferente de seus pares (reivindicações coletivas) em outros países. No caso de Portugal, uma vez que o processo é admitido, o juiz dá um prazo para os consumidores que querem que ele deixe o processo. Se não fizerem nada, estão incluídos no processo. Isso é processado, e se o Google e a Apple forem condenados a pagar uma quantia econômica, o mercado português é notificado para que todo o consumidor que fez uma compra desde janeiro de 2013 reivindica o valor que corresponde a ele, estabelecido pelo juiz.

No entanto, as alegações contra os dois gigantes devem ser admitidas pelo juiz, passar por uma fase de audiências preliminares, apresentação de indenizações por peritos profissionais e chegar a julgamento. E mesmo assim, há dois casos em que a Apple e o Google podem reivindicar.

Como em Portugal, tanto no Reino Unido quanto na Holanda, a Apple e o Google foram processados por essas práticas anticoncorrenciais.

A concentração na distribuição dos aplicativos em duas lojas é perniciosa a concorrência, pois limita os desenvolvedores a estarem nas mãos desses dois grandes players e ao mesmo tempo concentra uma quantidade de dados absurda.

Lembro que em 2020, o Comitê Judiciário da Câmara dos Representantes, na Câmara dos Deputados dos EUA, publicou o relatório final de uma investigação que realizou por mais de um ano sobre as gigantes de tecnologia. O texto, com 449 páginas, afirmou que as empresas abusaram de seu poder de monopólio, em uma força só antes vista na época dos barões do petróleo, no início do século XX, apertando o cerco sobre as Bigtechs.

Não resta dúvida a importância da transparência e o risco da concentração mas plataformas que atuam como ferramentas de busca, afinal a informação faz a diferença no mundo real, é ela que permite alterar o curso das coisas, bem como das lojas de venda de aplicativos.

É a informação que pode gerar algum tipo de surpresa produtiva, útil, pois é a inteligência que cria um “novo” que funcione, ou que altere um curso de ação estabelecido, logo a concentração em apenas dois canais de venda é um limitador ao acesso a novas funcionalidades.

Por isso a sua circulação e comercialização livre, faz sim toda diferença e nisso reside o risco da concentração nas mãos de poucos, pois cada vez mais informação (produtos e serviço) é efeito, não estoque, ela é transformação, movimento, não armazenamento.

Ao dirigir nossas buscas os sites como o Google acabam por dirigir também nossas escolhas, resultando daí seu maior risco, pois pode sim manipular opiniões pela escolha preditiva do conteúdo ou da busca por compra de produtos e serviços. Alguém que não comprava passa a comprar, um mercado que não existia passa a existir, uma transação que demorava e agora é feita mais depressa, de forma menos custosa, com mais conveniência.

O que vem fazendo a diferença no mundo das organizações é geração de resultados por meio de ação alimentada pela informação. Logo informação, para um gestor, é sinônimo de inteligência para alterar, o que acaba por interferir no circulo de venda na medida em que a concentração em apenas duas lojas pode sim colocar prioridade nos aplicativos que sejam de sua preferência ou que paguem taxas maiores.

Por isso todo o cuidado com a influência cada vez maior do Google, tanto que o Departamento de Justiça dos EUA (DOJ, na sigla em inglês) e um grupo de advogados-gerais de diversos Estados americanos está considerando forçar o Google a vender o navegador Chrome.

Elas também fazem parte do contexto de investigações antitruste feitas com quatro gigantes de tecnologia, além do Google, Amazon, Apple e Facebook também estão na mira das autoridades americanas. As quatro empresas foram citadas em um relatório recente da Câmara dos Deputados dos EUA como donas de monopólios e podem sofrer diversas sanções no futuro.

Na visão do DOJ, o Google utiliza seu navegador para manter seu negócio de publicidade digital na dianteira da indústria, um mercado global de US$ 162,3 bilhões, cujo controle está com a empresa de buscas e o Facebook, juntas essas duas empresas possuem mais de 25% de toda verba publicitária do mundo.

No caso da proposta atualmente em discussão no DOJ venha de fato à tona, pode ser o primeiro caso de desmembramento de uma companhia em décadas nos EUA, é bom lembrar os casos mais notórios, que foram da Standard Oil, no início dos século XX, e da AT&T, nos anos 1980.

Nesse momento a ameaça de desmembramento de empresas também apareceu no relatório da Câmara, mas é apoiada apenas pelos deputados democratas os republicanos são contra a proposta, que após 15 meses de investigação, soltou um extenso relatório que ataca práticas anticompetitivas por parte de quatro das cinco gigantes da tecnologia, nesse relatório escapa a Microsoft. O curioso é que republicanos e democratas nesse instante estão discordando não da concentração, mas sim da pena que deve ser aplicada, ou seja, vem punição aí de qualquer jeito.

O Google controla dois mercados, o de busca e o de publicidade atrelada a busca. E é um negócio tão amarrado num canto a outro que tudo parece fazer parte dum conjunto. Pense então, o Chrome seria o browser mais popular do mundo se não fosse promovido pelo Google? A busca seria assim tão livre de concorrentes se não estivesse integrada a todos os smartphones com Android? Os Mapas seriam dominantes caso não fossem parte do todo?

É importante dizer que o Congresso não tem poder de dividir empresas num processo antitruste, isso só o Departamento de Justiça pode fazer, argumentando perante um juiz, mas pode legislar. Os democratas querem leis como as da Grande Depressão, que proibiram bancos de investimento de oferecerem serviços de banco no varejo, ou seja, leis similares proibiram empresas de atuarem em dois mercados paralelos que podem promover benefícios monopolistas.

Além de recomendar acompanhamento próximo da atuação das quatro empresas, a Comissão de Justiça da Câmara sugeriu uma profunda reforma da legislação antitruste. “A totalidade de evidências produzidas durante esta investigação demonstra a necessidade de ação legislativa e reforma”, diz o relatório da Comissão. “Essas empresas têm muito poder, poder que deve passar por escrutínio, supervisão e regulação.” Por conta das eleições americanas agora em novembro, nenhuma mudança prática deve ocorrer no curto prazo.

Para ficarmos em um exemplo dessa concentração, vamos imaginar o que aconteceria se o Google fosse bloqueado, como viver sem ele?

Ao bloquear o Google, o primeiro resultado é que a internet inteira deve ficar mais lenta, afinal quase todos os sites que você visita utilizam ele como fonte para rodar os comerciais, lembre-se Facebook e Google possuem cerca de 22% de toda publicidade digital, logo, veja também onde seus dados são armazenados, caso seja o Dropbox ao bloquear o Google, há o risco de você perder o acesso, pois o site pode pensar que você não é uma pessoa de verdade. Uber e Lyft devem parar de funcionar para você, pois, ambos dependem do Google Maps para navegação. Descobri que, na prática, o Google Maps exerce um monopólio no segmento dos mapas online. Visto isso, concluímos que esses dois hoje são aqui na américa os provedores da infraestrutura da internet, de tão misturadas que são às arquiteturas do mundo digital, que até mesmo suas concorrentes acabavam dependendo desses dois barões.

O caso pode apenas dar a dimensão da reforma legal que o mundo precisa para diminuir a força das Plataformas Digitais, antes que elas tomem de vez o controle de nossas vidas.

(Artigo publicado no site www.jusbrasil.com.br, em 30 de Julho de 2022).

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