A MÚSICA E A PINTURINHA NO PAINEL

Por volta de 2002 uma montadora francesa fazia um comercial interessante do seu carro, o vídeo dizia que o carro já era tão bom que não precisava de grandes mudanças, então eles resolveram de um ano para o outro fazer “apenas uma pinturinha no painel”. Um produto tão bom que precisaria afinal de quase nada de ajuste. Bem o que aconteceu com esse carro? Nunca foi líder no seu segmento e ainda por cima deixou de ser fabricado.

As gravadoras de música se comportaram exatamente igual a esse fabricante, com o crescimento da pirataria dos cds, com os tocadores de mp3 e da mesma forma com os serviços de streaming.

Qualquer semelhança com as emissoras de TV aberta e a cabo, e com os jornais impressos e rádios não será mera coincidência.

Primeiro como qualquer segmento da economia diante da ruptura do modelo econômico e com a substituição do seu negócio, por outro melhor, o comportamento de líderes quase sempre é acompanhado por muitas dessas frases:

“Duvido que o nosso consumidor se acostume com esse novo produto (o mesmo vale para serviços)”.

“Essa ideia não vai pegar.”

“Em time que está ganhando não se mexe”.

“Nós sempre fizemos, bem feito pois não mudamos, logo pra que mudar?“

Essas e outras frases nesse sentido, quase sempre serviram como certidão de registro de uma empresa que parou no tempo, pois gostemos ou não as mudanças são quase sempre irreversíveis.

A lógica do capitalismo diante da abundância de novos produtos e novos serviços, e com o não crescimento da renda é sempre procurar algo melhor e mais barato.

Liderança exige adaptação permanente, reinvenção constante e um olhar no futuro como horizonte e não como problema.

Todo caminhante, olha o horizonte na sua trajetória como meta, destino pois se ele olhar com foco na dificuldade ele jamais chegará, ou se o fizer será com perdas e dores terríveis. A mudança permanente é a única certeza na natureza e logo na história, mesmo que algumas dessas mudanças possam por um período de tempo, ainda que curto representar um retrocesso.

Logo o universo da música não poderia deixar de ser diferente. Isso me faz lembrar uma reunião que tive me 2005 em uma grande gravadora no Rio de Janeiro, quando representava uma dupla de cantores de música sertaneja (eles odeiam serem chamados assim, preferem ser chamados de cantores de música romântica). Naquela época os números já vinham derretendo, e logo a causa era a pirataria e os tocadores de MP3.

Como todo movimento, a briga era pela discussão dos direitos autorais e por melhores canais de distribuição de música.

O diretor daquela grande gravadora me falava que para combater esses dois fatos estavam criando quiosques em grandes centros comerciais para que as pessoas pudesses fazer downloads de seus artistas e cantores preferidos, gravando em CDs (MP3) sua playlist favorita. Nessas horas o consultor prefere ser surdo, afinal meu silêncio parece concordância e se falo exatamente o que penso posso prejudicar meus clientes e ou ter a porta fechada para próximas reuniões.

Bem acabo falando de forma diplomática algo que me leva do nada ao lugar algum “bem interessante, um desafio fantástico para esse período de transformação” O diretor que ouve se sente o máximo e eu não deixei de me manifestar diante daquela ideia estapafúrdia no típico “pinturinha no painel”.

Como o meu cliente eram os artistas e não a gravadora resolvi não dizer exatamente o que eu realmente pensava, naquela saia justa de consultor, falou mais alto a prudência.

Afinal os tocadores de MP3 evoluíam de forma assustadora e as pessoas compravam nos camelos aos CDs piratas simplesmente por uma questão financeira, por mais absurdo que fosse o vilipêndio sofrido pelos artistas e seus direitos autorais.

Ou seja, o segmento de entretenimento voltado para gravação, produção, distribuição e comercialização de música estava diante de uma mudança sem volta, e tudo e toda resistência servia para discussão do novo e um freio na velocidade do novo, mas não tinha volta.

O setor seria como acabou sendo completamente reinventado.

Nesse momento as maiores plataformas de streaming de música, Spotify, Amazon, Apple, Deezer, YouTube Music, juntas tem cerca de 500 milhões de assinantes e mais de 1 bilhão de usuários, que pagam mensalmente para ouvir, editar e criar suas playlists, e quantas são as lojas de CDs que ainda existem?

Dentro da lógica da “Economia Da Atenção”, que em seu grau elevado gera a “Economia Da Desatenção” nunca foi tão fácil gravar e nunca foi tão difícil fazer sucesso.

Mudou a forma de distribuir e consumir musica e os novos protagonistas não são as velhas e tradicionais gravadoras.

Os tocadores de MP3 abriram esse caminho, com cada um podendo escutar o que queria no horário que queria e em novas plataformas.

Quando os smartphones ainda não existiam, se você quisesse ouvir músicas na rua, era necessário ter um Walkman ou um tocador de MP3, algo que já exigia um pouco mais de conhecimento na Internet para baixar músicas e passar para o dispositivo.

Algumas características desses aparelhos eram comuns, e que se no primeiro instantes conseguiam ganhar o espaço dos tocadores de CDs, depois perderam espaço para o streaming:

  1. Baixa Capacidade de armazenamento, pois esses dispositivos tinham capacidade máxima de 256 ou 512 MB. Isso fazia com seu player passasse por uma cuidadosa seleção, já que todo espaço era muito importante. Com o tempo, as opções de 1 GB começaram a surgir, e se tornaram sonho de consumo para muitas pessoas. Apesar disso, não era possível expandir essa capacidade, já que os cartões microSD não eram uma realidade acessível.
  2. Necessidade de se fazer download das músicas no PC, pois no início dos anos 2000 a internet ainda era precária. Os MP3 Players precisavam ser conectados a um computador com os arquivos mp3 para serem abastecidos, já que não se conectavam à Internet. Com o fácil acesso a qualquer discografia nos dias de hoje, é difícil imaginar a necessidade de fazer o download de um arquivo de música. Esta ai uma das principais razões da ideia do diretor da gravadora que falei acima não fazer sentido e claro nunca ter saído do piloto.
  3. .O MP3 Player como amigo do Media Player, sim, pois o Windows, e como sempre com sua posição dominante (Windows Media Player), era utilizado para armazenar as canções dos discos no computador. Assim, os arquivos obtidos a partir dessa manobra podiam ser transferidos da biblioteca do programa para um MP3 Player.
  4. Função de pen drive também, afinal ter um disco removível nos anos 2000 era um luxo, e, até pelo formato, muitos usuários utilizavam seus MP3 Players como pen drive para transferir arquivos entre um PC e outro. Para isso, bastava adicionar uma pasta com um nome diferente para não atrapalhar na hora de encontrar as músicas da playlist. Com o espaço limitado, não era possível subir arquivos muito grandes, limitando o uso.
  5. Ipod, não foi o primeiro tocador de MP#, assim como o Iphone não foi o primeiro smartphone lançado, mas para ambos os casos a Apple foi quem teve a leitura correta, seus aparelhos são plataformas e isso fez com que todos tivesses sempre seus aparelhos como refer6encia, e perto deles os demais sempre eram apenas cópias.

Essas foram as principais razões, mas não foram os possíveis defeitos desses aparelhos que abriram espaço para o streaming, mas ainda a dinâmica, o baixo custo e a velocidade na distribuição de novo conteúdo, que no primeiro momento era de músicas e hoje já abre espaço para os podcasts

Mais espaço, mais dinâmica e principalmente custo abaixo transformou o streaming uma unanimidade, em que pese o enfrentamento legal quanto ao modelo de remuneração dos direitos autorais, algo relativamente pacificado hoje.

O tempo, retirou o protagonismo das gravadoras, e ditavam o ritmo, agora são as plataformas de streaming que ditam o que vai tocar.

Se no início a estratégia era de fragmentação de artistas em determinados canais de streaming na busca pela exclusividade, essa tendência primeira já se dissipou, pois ela não era nem um pouco inteligente, pois é bom competir na interface, em algoritmos de recomendação, em versatilidade ou em ubiquidade. Mas competir no repertório, neste caso, não importa o quão consolidado seja dentro da indústria, é um erro. Assim como o cérebro dos consumidores que se acostumaram durante anos a colocar o nome de uma música em um navegador e baixá-la instantaneamente funciona, a possibilidade de pagar por uma plataforma e não encontrar a música que eles estão procurando funciona como um forte desincentivo. Não esqueçamos que o hábito de baixar música simplesmente digitando o nome de uma música em um navegador e baixando-a sem mais problemas ainda está perfeitamente disponível, fazendo isso ainda é extremamente simples, e o nível de uso nunca caiu por causa de perseguições legais, mas por causa do aparecimento de serviços de qualidade que a tornaram praticamente desnecessária, em uma espécie de atavismo, o que se explicava no início, mas hoje não encontra mais espaço.

A ideia de que a música deixou de ser um produto que adquirimos vinculado a um suporte físico, para se tornar um serviço de assinatura que nos permite acessar em troca de um pagamento periódico já é completamente aceitável para nós, e sem dúvida se tornou um dos principais arquitetos de downloads irregulares que caíram em quase todos os mercados:  nada é tão eficaz quanto competir com um bom serviço, não importa o quanto alguns fingissem que “você não poderia competir com os livres”.

Para se tornar lucrativo, o Spotify depende muito da escala. A abordagem para a rentabilidade de seu serviço é necessariamente a de “muito pouco”, uma imensa quantidade de transações que cada uma representa uma quantidade minúscula de dinheiro, mas que tem um elemento interessante: uma vez que você experimentá-lo como um serviço premium, é muito difícil cancelar a inscrição. Visto dessa forma, o que o Spotify tenta o tempo todo é incentivar o teste através de acordos de todos os tipos.

Ao longo deste ano, o Spotify começou discretamente uma experiência muito interessante: chegar a acordos de licenciamento direto com um certo número de artistas independentes, além degravadoras. Esses acordos de licenciamento com o Spotify oferecidos a artistas que não operam através de uma gravadora não são exclusivos, permitem que esses artistas distribuam suas músicas também através de outras plataformas como Amazon ou Apple Music, ofereçam-lhes para receber uma quantidade muito maior dos direitos gerados pelas reproduções, e também permitir que eles mantenham todos os direitos de propriedade sobre suas músicas.

Em um acordo padrão, o Spotify paga às gravadoras 52% do volume de negócios gerado por cada música, e a gravadora paga ao artista uma porcentagem que geralmente varia de 15% e, em alguns casos excepcionais, até 50% desse valor

Artistas que assinam diretamente com o Spotify em vez de através de uma gravadora passariam a receber toda a receita que a empresa paga atualmente a essas gravadoras. No momento, isso está chamando a atenção de artistas relativamente pouco conhecidos na fase de construção de sua imagem, mas a ideia de manter a propriedade de sua música poderia eventualmente se mostrar atraente para outros artistas mais estabelecidos: Taylor Swift, após anos de sucesso com sua gravadora, está disposta a se tornar uma agente livre. Assim que seu contrato atual expirar, e ela poderia continuar a receber acordos de distribuição deste tipo que lhe permitiriam explorar os direitos de sua própria música através de canais de streaming.

É difícil saber qual a reação das gravadoras, que formam uma pequena parte da participação acionária do Spotify, pode ter se começarem a sentir a pressão de um dreno de talentos tanto no lado baixo, a de atrair talentos como possíveis promessas, quanto na parte superior, a dos artistas mais consolidados que exigem a negociação de condições mais vantajosas. Perspectivas de desintermediação que, por outro lado, fariam todo o sentido: o valor agregado atualmente gerado por uma gravadora tem fundamentalmente a ver com a chegada dos canais de distribuição, e nesses canais de distribuição, não há dúvida de que as plataformas de streaming estão progressivamente se tornando os jogadores mais importantes.

Em um mercado definido dessa forma, tudo indica que a relevância da função das gravadoras poderia ser diluída, e levar a uma desintermediação que, por outro lado, entraria em conflito com a enorme alavancagem que essas empresas têm sobre a grande maioria da música atual. Atualmente, nenhuma plataforma de streaming poderia sobreviver sem acesso ao catálogo das gravadoras, o que torna a situação, para muitos artistas que na época negociavam com eles, difíceis de mudar. Mas a experiência do Spotify, oferecendo a alguns artistas uma avenida alternativa que lhes permite não perder o controle ou a propriedade de suas criações poderia fazer da tecnologia o melhor amigo dos artistas, e nos aproxima do que o mundo da música possivelmente deveria ser.

Em um mercado definido dessa forma, tudo indica que a relevância da função das gravadoras poderia ser diluída, e levar a uma desintermediação que, por outro lado, entraria em conflito com a enorme alavancagem que essas empresas têm sobre a grande maioria da música atual. Atualmente, nenhuma plataforma de streaming poderia sobreviver sem acesso ao catálogo das gravadoras, o que torna a situação, para muitos artistas que na época negociavam com eles, difíceis de mudar

A Universal Music Group (UMG) fez um bom começo em sua jornada no mercado de ações, nesse ano. A marca Vivendi estreou na Bolsa de Amsterdã com um preço inicial de 18,5 euros e uma capitalização inicial de mercado de 33,4 bilhões de euros. Minutos depois, às 9:08 euros, tocou 26,45 euros, marcando uma alta no dia de 42,9%. Assim, a Universal Music estrelou a maior estreia na Bolsa de Valores da Europa este ano. Mas o salto para o mercado de ações não foi feito através de uma oferta pública para venda de ações (IPO), mas através de um spin-off do negócio. A Vivendi distribuiu 60% do capital da UMG como dividendo extraordinário entre seus próprios acionistas, que a partir de hoje puderam começar a vender suas ações no mercado.

Após essa distribuição, a Vivendi detém 10% da gravadora e seu principal acionista, Vincent Bolloré, receberá 18% da Universal Music como dividendo. Além disso, o bilionário americano William Ackman e a chinesa Tencent também têm 10% de participação cada.

Prognósticos positivos

O sucesso da Universal Music no parquet não surpreende no mercado. Analistas já estavam prevendo um bom começo na Euronext holandesa. Suas previsões se devem à boa performance desta empresa, que carrega as coleções de músicas dos Beatles, Lady Gaga, Justin Bieber e Taylor Swift, entre outros artistas de sucesso.

Investimentos de centenas de milhões de dólares de gigantes da tecnologia como Spotify, Amazon e Apple ressuscitaram esse formato e desencadearam a produção de conteúdo original para atrair usuários pagos.

O pod cast abre também uma avenida gigantesca nesse mercado. O Spotify, nos últimos dois anos, desembolsou mais de 680 milhões em seu compromisso com o podcast, com aquisições como o Megaphone por 235 milhões de dólares no ano passado, ou podz, em junho passado, por 53 milhões.

Outra gigante que acelerou nos últimos meses seu compromisso com esse mercado tem sido a Apple. A empresa Apple lançou oficialmente seu serviço de assinatura de podcast em junho e também tirou a carteira há apenas um ano para a aquisição da ScoutFM, da qual o valor não foi comunicado.

Esse alto ritmo de compras das gigantes da tecnologia se soma aos grandes investimentos que as plataformas de rádio dos EUA fizeram nos últimos anos, como a aquisição da Pandora pela SiriusXM por 3.500 milhões de dólares ou pela Triton Digital pela iHeartMedia em fevereiro deste ano por 230 milhões.

“Grandes empresas viram que o podcasting é um formato que lhes permite operar com acumulação de conteúdo em um nível maciço.

A Podimo, uma empresa dinamarquesa que desembarcou na Espanha há pouco mais de um ano, investiu 1,5 milhão de euros em produções originais em espanhol, o que se traduz em mais de 200 programas e um total de mais de 3.000 episódios de podcast.

Mas enquanto as plataformas estão procurando fórmulas de monetização, elas também devem fazê-lo com formatos. O problema?

empresas como Spotify ou Podimo tenham decidido optar por incorporar vídeo em suas plataformas.

Fórmulas enriquecidas para trazer novos ouvintes e manter o ritmo de crescimento que o podcast tem protagonizado nos últimos meses e que, segundo ele, ainda não atingiu seu esplendor completo

Um novo mundo, onde o Direito deve ser facilitador, pois a velocidade do mercado supera aliada com a vontade do consumidor supera os entraves legais redesenhando a forma de ouvirmos músicas, e noticiário, goste você ou não.

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